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Assim, no espírito das Bem-aventuranças, se esforcem para purificar o coração de toda inclinação e avidez de posse e de dominação, como peregrinos e forasteiros a caminho da casa do Pai. - Regra OFS nº 11

domingo, 23 de maio de 2010

A Santa e a "dada": duas mulheres


Na Igreja Romana, a devoção à Maria ganha ares de recato. Basta olhar para a imagem da Mãe de Deus: apenas deixa aparecer o seu rosto. Na Umbanda, Iemanjá pode ser exibida com os seios à mostra. Nenhuma pureza das vestes de Maria encobre a divindade de origem africana. Fica uma sugestão: uma é a Santa e a outra está bem longe disso. Mas são ambas mulheres. Nada mais e nada menos.


Santa Maria vem vestida com “sobriedade”. Dificilmente será encontrada, enquanto a sua imagem estiver sendo cultuada, com roupas diferentes de túnicas, que só permitem ver as mãos. Isto quando não são usadas luvas. A cabeça vem sob o véu. Face e mãos demonstram um comportamento de tranqüilidade favorável às pessoas em momento de oração. Mãos retas e juntadas ou direcionando um movimento unificado. Rosto sem aparentar tristeza ou alegria figuradas em olhos e bocas de lamentos ou sorrisos exagerados. (considerando que uma mulher de fé , como Maria, não se desesperou diante da Cruz) Muitas outras sugestões poderiam ser lembradas aqui. Mas parece desnecessário relatar uma Maria Santíssima tão casta, pois é assim mesmo que é vista em sua figura pintada pela Igreja Poderosa, sediada no Vaticano. Já é bem conhecida sob tantos panos e tecidos. Um detalhamento maior é um trabalho desperdiçado. Basta um “manual” que produz “cópias” de Maria ao estilo noiva de um anjo.


Iemanjá pode estar seminua. Ou nua mesmo, se for o caso de uma mulher que não traz consigo uma das peças de sua roupa. Assim retratada, acaba sugerindo alguma atitude corporal menos passiva em uma interação humana. Certamente não aparenta um corpo inerte, como é representado o equipamento humano em uma foto de manual de anatomia médica. Os braços buscam um encontro. Não estão, portanto, desenhados retos voltados para baixo. Ou então mostram-se soltos e não caracterizando o direcionamento que os leva a um ângulo de 90 graus com o chão. A parte inferior do corpo também passa a idéia de movimento, o que, mais uma vez, não se enquadra na atividade/passividade da pélvis para dentro do corpo (o sentido para fora do corpo é desenvolvido com o corpo mole e não rígido) ou direcionada para o chão. A cabeça parece acompanhar o resto do corpo ou fica solta para trás. Para frente ou para trás, certamente não é passiva como seria se fosse servir como modelo de anatomia.


Iemanjá não é Santa para os católicos, mas também transmite bondade em seus gestos. Maria é completamente Santa, mas é também mulher. Como exemplo feminino, não o é por sua anatomia simplesmente. Vive no corpo de uma mulher muito além da sua Santidade. Ou, como humana que foi (e continua sendo), está muito aquém da “santinha”. Pois é simples, como é o seu filho Jesus. O que pode parecer abstração teológica não passa de uma defesa humana do que há de mais humano.
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Guilherme Valle, sociólogo

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