por Irmão Marcelo Barros, osb*
Os governos imperialistas do mundo dividem os conflitos
bélicos em guerras de alta intensidade e conflitos de baixa intensidade. Para
dominar o mundo, usam a forma que lhes for mais conveniente para cada situação.
Ao contrário, os povos e grupos que se integram na caminhada por um mundo
renovado sabem que nenhuma guerra construirá a paz e a liberdade. Várias
experiências nos revelaram que somente a não violência e a educação para a paz
constroem a justiça e respeitam a dignidade humana. A cada ano, no dia 30 de
janeiro, a humanidade inteira recorda o dia em que, em 1948, na Índia, foi
assassinado o Mahatma Gandhi, mártir da não violência e da paz.
Nesses dias, em Dehli, há uma grande peregrinação de pessoas
de todo o país e até estrangeiros que vêm visitar o túmulo de Gandhi. Ali, homens,
mulheres e crianças costumam depositar uma flor sobre a placa de mármore negro
que cobre o túmulo. Os/as adultos/as chamam: "Mahatma Gandhi!". As
crianças respondem: "Anantha-he, Anantha-he!", isto é, "para
sempre, para sempre".
No Brasil, tão carente de líderes sociais que não vendam a
própria alma em troca de votos na próxima eleição, só podemos desejar que o
exemplo e a mensagem de Gandhi possam iluminar nosso país e seus dirigentes.
Gandhi afirmava: "Não tenho mensagens. Minha mensagem é simplesmente a
minha vida". Ele intitulou a sua autobiografia: "A história das
minhas experiências com a verdade". Gandhi sabia que essa verdade se chama
Deus. "Tudo o que eu faço é na busca de Deus. Anseio por ver a Deus, face
a face. O Deus que conheço se chama Verdade".
Mohandas Gandhi nasceu e cresceu numa Índia dominada pela
Inglaterra. Ali, ele julgava que a pior escravidão era "a alienação e a
superficialidade interior". Protestou contra a sociedade de classes que,
em nome da religião, considerava os mais pobres como párias, impuros. Insistia:
"As pessoas que não são filhas de famílias são filhas de Deus. A dor desses
irmãos e irmãs me transforma". De fato, a solidariedade mudou a sua vida.
Não apenas por uma visão política, mas por uma opção de fé, vivida no
hinduísmo. Hoje, proliferam pelo ocidente grupos e movimentos hindús. Praticam
a yoga, cultivam a alimentação natural, cuidam da respiração e praticam a
meditação transcendental. Tudo isso, Gandhi fez. A um ponto tal que se tornou
um místico, reconhecido no mundo inteiro como Mahatma, a Grande Alma. Nunca
iniciava uma luta sem um jejum. Esse jejum era visto como uma forma de greve de
fome, mas tinha como base a espiritualidade. Dizia: "Não é possível viver
a espiritualidade no egoísmo. Não é possível salvar a si mesmo sem salvar os
outros".
O seu método de trabalho consistia em duas atitudes
interiores: a satyagraha e a ahimsa. A primeira era a
"desobediência civil". Se uma lei é injusta, não se deve obedecê-la.
É o compromisso do crente com a verdade. Como fazer isso? Pela ahimsa: a
não violência ativa. Só se pode dizer que é espiritual quando se extingue de si
mesmo toda a violência. Não só a violência física, mas também a violência
verbal, mental e emocional; libertar-se do próprio egoísmo, da avareza e das
paixões.
Para Gandhi, a oração era a base do compromisso social.
Ensinava: "Orar é a respiração do espírito". Ele tinha um
temperamento inquieto e não conseguia ficar imóvel. Quando tentava, o braço
coçava, o cotovelo doía, a barriga roncava. Por isso, desenvolveu "A roca
do calmo pensar". Enquanto tecia, entrava na respiração consciente,
repetia a mantra (invocação a Deus) e orava. Está publicado em português:
"A Roca e o calmo pensar" (Ed. Palas Athena, 1991).Outro método espiritual que Gandhi usava muito era a
peregrinação. Até com 77 anos, percorreu a pé e descalço, muitos vilarejos de
Bengala, Bihar e Punjab. Por onde passava, pedia a união entre hindus e
muçulmanos. Para viver melhor esse diálogo, decidiu morar em um bairro dos
muçulmanos em Delhi. Lá foi assassinado por um fundamentalista da sua própria
religião, que não concordava com o seu ecumenismo e o considerava traidor do
hinduísmo. A última palavra do Mahatma foi: "He Hama!", "Ó
Deus!".
Ao celebrar a memória do
Mahatma Gandhi, um dos maiores santos não cristãos, renovemos nosso compromisso
com a paz e a justiça e nos lembremos de suas palavras: "Lembre-se das
pessoas mais pobres que você conhece. Pergunte se o ato que você planeja ou o
seu modo de viver é de algum modo proveitoso para essas pessoas. Se for, através
desses atos, você encontrará a Deus".
Nenhum comentário:
Postar um comentário