About

Assim, no espírito das Bem-aventuranças, se esforcem para purificar o coração de toda inclinação e avidez de posse e de dominação, como peregrinos e forasteiros a caminho da casa do Pai. - Regra OFS nº 11

terça-feira, 30 de outubro de 2012

O lugar no qual a mente repousa em Deus

Fred Félix, OFS


Carros correm pelas avenidas, pincelando com suas diversas cores os grandes espelhos que sobem em direção ao céu através das paredes dos grandes edifícios. Tudo corre, tudo se movimenta rapidamente. Mensagens diversas atravessam o espaço por ondas e sinais invisíveis aos olhos e se solidificam no cristal das telas de celulares e tablets. Passadas ligeiras das portas das casas para as portas dos ônibus e carros. A procissão se forma em mais um dia. Tudo corre, tudo se movimenta rapidamente.




Somos resultado de todo este movimento e velocidade. Criamos a necessidade da instantaneidade em nossas vidas. A nossa necessidade de encurtar os espaços teve por consequência o encurtamento do próprio tempo. Somado a isso, múltiplas tarefas tomam ainda a rotina. Acordar, trabalhar, estudar, rezar, se alimentar e cuidar, cultivar os relacionamentos, ler as mensagens e respondê-las, cozinhar, arrumar, se exercitar... tantos verbos. O tempo parece até que diminui com o seu próprio passar. O dia terá mesmo aquelas vinte e quatro horas que a professora nos ensinou no primário?!

Apesar de toda a velocidade, somos os mesmos homens que buscavam abrigo em cavernas, depois nos castelos e casebres, choupanas, casas e casarões, e por fim edifícios. Da mesma forma que operamos o machado e a lança, as ferramentas do artesão, a máquina a vapor, o mimeógrafo e a prensa e agora os micro computadores. Não deixamos de ser seres que envelhecemos e nos cansamos. Uma hora chega em que o fardo é sentido, mesmo quando a sensibilidade falha e nada avisa. A ansiedade ronda, o medo bate a porte e a depressão se instala. Tal como o lutator que vai de encontro ao chão com um apagão completo (lockout), sem vista e sem audição, perdemos nossa orientação e nos perdemos no tempo e no espaço, na realidade da existência.

Nunca se falou tanto em meditação no ocidente. Diversos tipos e diversas denominações. Buscamos insensantemente um pouco de paz. Consumimos a promessa de um pouco de paz. Se não a alcançamos mudamos o produto, devia estar sem efeito, ou fora de validade. Como cegos em frente á luz, não percebemos que a paz vem do não buscar. A paz que tanto se quer está no repouso.

Durante bom tempo eu li e ouvi que Deus era movimento e repouso. Vendo sua criação, contemplando a dança do vento nas árvores, o balançar dos andares e os rastros da luz do dia sempre entendi o movimento no qual Deus se faz presente. Mas e o repouso? Que repouso é este no qual Deus mesmo demonstra sua semelhança? Cego em frente a luz. A mensagem tão às claras e tantas vezes repetidas no silêncio da alma e a surdes da sensibilidade não permitia escutar.
Porém é impossível escrever a resposta se ela é simplesmente silêncio. O repouso em Deus é de forma simples apenas o silenciar, coisa que nunca foi tão difícil como nos dias de hoje.


Buscamos então lugares para construir este ambiente de silêncio, mas mesmo sem barulho externo vozes e pensamentos gritam na mente. É mister encontrar este lugar tão sagrado e místico no qual possamos ver Deus face a face e contemplar a imagem de seu repouso. Mais uma vez, a resposta está perto, sendo necessários apenas descer o pensamento até a altura do peito e sentir os batimentos do coração.

Sim, o coração. Símbolo da afetividade e do sentimento. Ritmo interno, mantra constante. Seu pulsar demonstra tudo o quanto estamos sentindo e vivendo. Suas frases, interminavelmente repetidas, tem uma capacidade única de nos conduzir ao saguão no qual se encontra o régio esposo no aguardo pela alma meditante e contemplativa.

Nem uma palavra é trocada entre amado e amante, apenas os olhares se cruzam e o repouso se instala. Seis dias se passaram e a criação é completa, é hora de descansar. Se deita Maria para ouvir as palavras do amado, enquanto ainda em movimento trabalha Marta. E atrás da grande pedra que fecha o escuro túmulo espera o chagado corpo pela ressurreição. Repouso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário