Marcelo Barros, OSB
A ONU consagrou 16 de novembro como o dia internacional da
tolerância. Propõe que, nessa semana, em todos os continentes, se façam
esforços pelo diálogo e compreensão entre grupos e culturas diferentes. De fato,
o mundo atual é cada vez mais pluralista e, a cada momento, através dos meios
de comunicação ou da internet ou simplesmente pela convivência na cidade, cada
pessoa tem de conviver com outros que vêm de culturas diversas e professam
diferentes religiões. Para conviver bem com essa realidade, não basta tolerância.
A tolerância evita o confronto e a guerra, mas não chega a criar um ambiente
positivo de diálogo e compreensão. Normalmente se tolera aquilo que não se pode
evitar. Ninguém quer ser apenas tolerado. As pessoas, grupos e culturas merecem
ser respeitados e valorizados. Por isso, é importante deixar claro: a ONU usa o
termo tolerância no sentido mais positivo de uma aceitação de respeito e
convivência pacífica. Com esse sentido, a partir da segunda guerra mundial, o
termo passou a ser usado no diálogo intercultural e inter-religioso. Isso era
importante porque, no campo das religiões, durante a maior parte do tempo,
houve mais intolerância do que amor, mais discriminação do que a
disponibilidade de ver Deus presente e atuante nas outras religiões. Até hoje,
ainda ocorrem casos de discriminação e violência baseados na fé. Por isso, a
tolerância, como princípio e caminho, é um primeiro passo positivo e fecundo.
No Brasil, há um ano, a ministra Maria do Rosário, da
Secretaria da Presidência da República para os Direitos Humanos, instituiu a
Comissão Nacional da Diversidade Religiosa, para atuar em todos os casos, nos
quais o desrespeito aos direitos humanos vem de preconceitos e discriminação a cultos
e a grupos religiosos. Para que esse tipo de iniciativa chegue às bases, em diversos
estados, têm se criado fóruns permanentes de diálogo intercultural e inter-religioso.
Nessa segunda feira, 12, na Assembleia Legislativa de Pernambuco foi instituído
o Fórum Pernambucano de Diálogos do qual participam representantes da Igreja
Católica, de várias Igrejas evangélicas, do Judaísmo, Islã, Candomblé, Umbanda
e outros grupos religiosos.
A instituição de comissões como essa ajuda muito não só a
promover a lei como a criar uma cultura de diálogo e interculturalidade. A lei pode
impedir a discriminação e a injustiça, mas não pode obrigar ninguém a amar o
diferente e a valorizar uma cultura que não é a sua. Isso supõe uma opção
“espiritual”, ou seja, abertura amorosa ao diferente, como opção de vida. De
fato, as religiões foram criadas para ensinar as pessoas a amar e a fazer do
amor uma lente especial com a qual se olha a vida, as pessoas e as culturas. Entretanto,
quando se deixam aprisionar pelo autoritarismo e pelo dogmatismo, as religiões se
tornam fonte de intransigência, intolerância e violência. Na história, todas as
religiões, de um modo ou de outro, tiveram momentos de intolerância e
combateram-se entre si. Ao preparar o ano 2000, em nome da Igreja Católica, o papa
João Paulo II pediu perdão à humanidade pelas Cruzadas, Inquisições e outros
erros que os cristãos cometeram no passado. O reconhecimento do erro e o pedido
de perdão são importantes, mas não levam a nada se a Igreja não se converte
sempre e cada vez mais ao universalismo do Espírito Divino e não toma uma
atitude positiva de companheirismo e amor com os outros grupos religiosos.
Hoje, o Brasil é um país leigo, mas ainda dominado por uma
cultura de Cristandade. Os feriados religiosos são em geral católicos. Os
símbolos mais aceitos são os da Igreja. Pelo modo como na história, a Igreja se
impôs, ela tem uma dívida histórica e moral para com toda a humanidade, mas
especialmente com as religiões indígenas e negras. Deve dar o exemplo de
abertura ao diálogo e à convivência intercultural e inter-religiosa. Nessa
semana, a própria ONU convida a que Igrejas, religiões e organismos da
sociedade civil possam unir-se na construção de uma sociedade pluralista e,
como dizia um pai da Igreja do século III, “aberta a tudo o que é humano”. Essa
atitude testemunha para os outros o amor divino e nos confirma a todos no
caminho do evangelho de Jesus Cristo que afirmou: “Muitos virão do Oriente e do
Ocidente e se sentarão à mesa do reino de Deus” (Mt 8, 11). E também: “Quem não
é contra nós, está do nosso lado” (Mc 9, 40).
Nenhum comentário:
Postar um comentário